Refletindo sobre Qualidade de Vida

Fui diretor da Associação Brasileira de Qualidade de Vida e palestrante em muitas empresas e, em diversas oportunidades, me perguntaram se é possível falar em QV morando em São Paulo? Dá para não se estressar? Qual o caminho para viver com mais qualidade? Essas perguntas valem uma reflexão:

Desde que nascemos, somos forçados a nos adaptar a uma realidade cada dia menos natural. Quando bebês, somos atendidos de maneira apressada e insegura por nossos pais, que têm cada vez menos tempo (quantitativo e, pior, qualitativo) para perceber nossas reais necessidades (o que é diferente de nossos desejos); comemos não exatamente quando temos fome, mas nos “horários certos” em que o almoço e o jantar são servidos; vestimo-nos não como queremos, mas para “prevenir resfriados”.

Entramos na escola cada vez mais cedo, e nela aprendemos intensivamente a nos defender e sociabilizar antes mesmo de termos a exata medida de quem somos. Assistimos à TV e a filmes de vídeo em vez de brincar nas ruas (cada dia mais inseguras). Começamos a nos relacionar com computadores, playstations, a net com suas infinitas redes sociais e outras realidades virtuais ao invés de nos relacionarmos com pessoas nos parques e praças próximos à nossa casa.

Quando crianças e pré-adolescentes, precisamos aprender línguas, praticar esportes, desenvolver aptidões artísticas e saber informática para expandir ao máximo nossa inteligência emocional e garantir maior chance de sucesso na sociedade, cada dia mais competitiva.

Nessa época crucial, em que desenvolvemos a exata percepção de mundo e de quem somos, recebemos as primeiras instruções e valores sobre o “sucesso na vida” via propaganda televisiva: guloseimas, brinquedos eletrônicos de última geração, moda infantil para estarmos “in” e dezenas de outros produtos que devemos consumir.

Pedimos aos pais esses “presentes”, e eles, assoberbados de trabalho e culpados por sua ausência, têm muita dificuldade em colocar limites nesses desejos. Com a falta desses limites vamos nos tornando insaciados e insaciáveis, incapazes de entender que muito do que conseguimos tem mais valor se for conquistado, merecido e no devido tempo.

Já na adolescência e na vida adulta lutamos constantemente para sermos aceitos familiar e socialmente, reconhecidos profissionalmente, percebidos e admirados afetivamente, buscando sobreviver e juntar algum dinheiro para perpetuarmos nossa existência. Até que um dia (e esse dia chega de forma diferente para cada um), nos percebemos estressados, ansiosos, angustiados e infelizes.

Para conseguirmos superar todos os desafios com os quais nos deparamos, nos adaptamos aos almoços rápidos e alimentos de péssima qualidade, ao trânsito ruim e agressivo, à indiferença das pessoas, ao tempo sempre escasso, às desculpas infinitas e ao adiamento da realização de nossos sonhos.

Uma sensação de vazio interior pode aparecer, mas é rapidamente superada por algum afazer e deixamos de pensar nela. Simplesmente deixamos de nos importar se estamos ou não realizando algo importante, com significado. Mudar parece uma tarefa imensa que requer mais coragem do que pensamos ter. Todos nós sonhamos com a conquista da saúde de forma mais ampla, mais integral, mais holística. Poucas pessoas percebem, porém, que essa saúde se cria, e a responsabilidade por criá-la, ou não, é nossa. Quem nunca se ocupou com isso deve começar agora, pois o presente é a única porção de tempo que está sob nosso controle.

O problema é que muita gente vai empurrando a questão para o futuro por causa da falta de tempo no presente. Grave equívoco. Já dizia o grande escritor Flaubert: “O passado nos retém, o futuro nos inquieta. Eis aí por que o presente nos escapa!”.

Quem está disposto a se reeducar em busca da saúde plena pode começar com providências fáceis e imediatas. Saúde integral é fruto de um processo de conscientização, educação, estilo de vida, mudança de paradigma, é SER saudável.

Ser saudável tem uma abrangência global, significando desde saúde física, mental, emocional e espiritual até saúde ocupacional, social e ambiental.

É com essa visão holística que procuro enxergar, diagnosticar e cuidar da saúde de meus pacientes. Não importa a idade que eles tenham, que tipo de sintoma apresentem ou que doença diagnosticada eles me tragam: sempre tento enxergar a pessoa por trás da patologia.

Quem é essa pessoa, como chegou a mim, o que busca, por que desenvolveu tais sintomas, de que forma vivencia a doença, o que ganha e o que perde com isso, quais são seus valores, suas crenças, seus sonhos, suas particularidades, , seus projetos? Cada uma dessas perguntas tem seu valor, seja na identificação da “doença” oculta da pessoa, seja no seu tratamento, que leva em conta seu modo de vida e suas características pessoais.

É com essa visão que acredito ser possível viver melhor e com mais significado e olha que nos dias de hoje, isso não é pouco não!